quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

Prescrição do Direito ao Pagamento dos Serviços de Telefone Móvel

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A questão sobre a qual importa obter uniformização de jurisprudência respeita à duração do prazo de prescrição do direito ao pagamento dos serviços de telefone.

Nos termos do disposto na redacção originária do n.º 1 do artigo 10.º da Lei n.º 23/96, de 26 de Julho, e no n.º 4
do artigo 9.º do Decreto -Lei n.º 381 -A/97, de 30 de Dezembro, o direito ao pagamento do preço de serviços de telefone móvel prescreve no prazo de seis meses após a sua prestação.

Assim uniformizou jurisprudência o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 1/2010 publicado no Diário da República, 1.ª série - N.º 14 em 21 de Janeiro de 2010.

Mas quantas excepções peremptórias foram julgadas improcedentes e a quantos recursos foi negado provimento, por entenderem os Tribunais que o disposto no nº 1 do artº 10º da Lei 23/96 de 26/07, não se aplicava ao Serviço Móvel Terrestre, em virtude de, não obstante estarmos perante uma prestação de serviço público de telefone, o mesmo não se tratava dum serviço essencial?

Quantos portugueses mercê do aparecimento do telemóvel deixaram de ter serviço fixo?
Tantos, que as empresas começaram primeiramente de deixar de cobrar assinatura mensal e posteriormente até começaram a oferecer as chamadas telefónicas efectuadas da dita rede fixa.

A verdade é que já em Setembro de 2002, 77.8% dos portugueses com idades compreendidas entre os 15 e os 64 anos utilizavam telemóvel.

De acordo com dados divulgados pela Anacom, a taxa de penetração em Portugal atingiu no final de Junho de 2007, 117,2%, 12,4 milhões de assinantes, cerca de 10 pontos percentuais acima da média europeia, ou seja, existiam mais telemóveis em Portugal do que habitantes portugueses.

Sempre acreditei que julgar consiste no esforço contínuo de adaptação do ordenamento jurídico às relações humanas que se desenrolam na nossa sociedade.

Homina causa omne jus constitutum est. O direito existe para os homens mas parece que neste caso o Direito existia para as operadoras de redes móveis.

Discutir-se até 2010 se o serviço móvel terrestre é ou não um serviço público essencial é no mínimo caricato.

Mas mesmo que o julgador fosse cego, surdo e mudo quanto a esta realidade social inerente ao uso do telemóvel por parte da população portuguesa, a verdade é que nunca na sua previsão a Lei excluiu, ou considerou como não essencial, o Serviço Móvel Terrestre.

Nem o poderia fazer, porquanto foi intenção do legislador ab initio, abarcar na dita Lei, o Serviço Móvel Terrestre.

A Lei 23/96 teve na sua génese a Proposta de Lei nº 20/VII, publicada no Diário da Assembleia da Republica, II Série-A, nº 33, de 4 de Abril de 1996, prevendo inicial e exclusivamente, na alínea d) do nº 2 do art. 1º o “serviço fixo de telefone”.

Porém, a Proposta de Lei apresentada pelo Governo à Assembleia da República, foi sujeita a críticas exactamente por apenas referir o serviço fixo de telefone.

E o debate na generalidade da Proposta de Lei no plenário da Assembleia da República, teve como desfecho a inclusão do Serviço Móvel Terrestre na Lei 23/96, o que consta no Diário da Assembleia da República, I Série, nº 56, de 12 de Abril de 1996.

Tal inclusão mereceu a aceitação da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, sufragada pelo Plenário dos Deputados.

E onde se lia “serviço fixo de telefone” passou a ler-se “serviço de telefone”.

O próprio “legislador”, João Calvão da Silva no seu trabalho publicado na RLJ, Ano 132, págs. 133 e sgts., nºs 3901 e 3902, 1999 in “Aplicação da Lei 23/96 ao S.M.T. e Natureza Extintiva da Prescrição referida no seu art. 10º” foi quem esclareceu:
”Em termos conclusivos: pelos ”Materialen”, trabalhos preparatórios, Proposta de Lei do Governo e iter parlamentar, e pelo fim da própria lei – finalidade de protecção dos utilizadores, que não toleraria a restrição do “serviço de telefone” ao serviço fixo e imporia antes a sua extensão a todo o serviço (fixo ou móvel) de telefone -, não pode haver qualquer dúvida fundada acerca do âmbito de aplicação da Lei nº 23/96: básico, fundamental e essencial para os utentes em geral é o serviço de telefone, independentemente da rede (fixa ou móvel) que o suporte e transporte, melhor, independentemente do sistema (fixo ou móvel) de acesso de assinante, pelo que não faria sentido deixar o telemóvel fora do âmbito (ditado pelo fim de protecção) da Lei 23/96."

Quantos milhares de consumidores não forem desde 1996 até à presente data, lesados patrimonialmente, mercê da condenação em pagamento de dívidas prescritas?

É caso para dizer: A justiça é cega mas a injustiça conseguimos vê-la!

2 comentários:

Anónimo disse...

Não se exalte tanto! Não era TAMANHA injustiça! Não se esqueça que, apesar de prescritas, as dívidas existiram.

Sandra Horta disse...

As que existiram!